Se há algo que fazemos desde a hora que acordamos até dormir é negociar, não é mesmo? Então imagine o quão importante é a negociação em M&A.
Ao chegar no trabalho, negociamos prazos de entrega com time em nossas video-calls, preços com fornecedores, cobramos clientes em atraso, etc. Ou seja, a negociação é uma rotina diária de todos.
Isso significa que todos somos bons negociadores? Isso significa que negociar é talento + prática? Ou será que há uma técnica + metodologia a ser aprendida?
Chutar uma bola muitos sabem, algumas pessoas até jogam bem. Mas, se você fosse convidado para jogar 90 minutos com a seleção brasileira na final da copa, você se sentiria preparado?
Então, deixa te contar um “segredo”: do outro lado da mesa de negociação em M&A, tem um cara faixa preta, tipo seleção brasileira. Isso mesmo. Alguém que já tem a experiência pois comprou dezenas de empresas, então o seu negócio vai ser apenas mais um. Ou seja, enquanto essa é a negociação da sua vida, para ele ou ela é mais uma de muitas negociações que ainda vai fazer. Ainda mais se for um investidor financeiro.
Ele está acostumado a negociar cláusula a cláusula de contratos de 300 páginas. Ele tem um time para preparar e analisar os 20 mil documentos que irão compor o data room (um ambiente virtual e seguro para averiguação documental) da due diligence. Além disso, ele tem “olhos de lince” para analisar cada documento e seu time é treinado com um único objetivo: mitigar risco, encontrar falhas e baixar o preço da sua empresa.
Você pensa: “Mas eu negocio o dia inteiro e posso fazer isso sozinho!”. Legal, então você consegue entrar na final da copa com a seleção brasileira e fazer gol?
Agora, se você não é do tipo teimoso e já falou com empresários que já venderam seus negócios, você sabe a importância de um negociador profissional. Afinal, médicos não operam parentes, pelo mesmo motivo. Não há espaço para emoção no meio do campo técnico.
Se você não conhece as técnicas por trás de uma boa negociação é bom começar entendendo os estilos comportamentais de negociação em M&A.
Estilos comportamentais de uma negociação em Fusões e Aquisições
Cada um de nós tem um estilo de negociação. Entender e respeitar as características da pessoa com quem estamos negociando aumenta nossa possibilidade de êxito. O primeiro passo é identificarmos o nosso próprio perfil, para isto é importante realizarmos um auto diagnóstico para levantarmos os pontos fortes e as possíveis armadilhas do nosso comportamento durante a negociação em M&A.
Outro aspecto importante é aprimorarmos a nossa percepção sobre as características pessoais da outra parte, a fim de estarmos aptos a adotar uma abordagem compatível com o outro.
Trouxemos abaixo todos os estilos de comportamento em uma negociação em M&A:
1. ANALÍTICO
Tenta influir pela razão, lógica, evidência e dados.
- Valores e gostos: Percebe e entende a estrutura, busca a discussão racional de problemas substanciais.
- Não gosta: Errar ou de uma conversa que seja muito emocional.
- Parece: Frio, estudioso, científico.
- Expressa: Regras gerais, sistemas e estruturas.
- Consegue: usar longas discussões e argumentos bem estruturados.
- Eficaz: Quando os problemas são claros e há precedentes. Prefere ambientes conhecidos.
- Ineficaz: Quando são necessárias soluções criativas e novas idéias; exploração de áreas desconhecidas.
- Pontos fortes: Articulado, preparado; vê os problemas de forma racional.
- Pontos fracos: Dificuldade na tomada de decisão. Demora e não gosta de decidir com pouco tempo.
2. PRAGMÁTICO
Tenta influir pela barganha, negociação, invocando a autoridade, recompensas e punições.
- Valores e Gostos: Intercâmbio, concessão de recompensas, esboço de consequências negativas.
- Não gosta de: Demonstrar fraqueza, discussões teóricas, emoções e filosofia.
- Parece: Inteligente, rápido e competitivo.
- Consegue: ideias não complexas, expressar valores de recompensas. Usa exemplos de casos de negociações passadas.
- Eficaz: Quando tem autoridade e poder.
- Ineficaz: Quando é necessário um comprometimento com objetivos amplos de longo prazo.
- Pontos fortes: Sente-se à vontade nas negociações; Assertivo.
- Pontos fracos: Pode passar por cima das diferenças muito rapidamente.
3. INTEGRADOR
Tenta influir ouvindo, estabelecendo a harmonia, unindo.
- Valores e Gostos: Relacionamentos pessoais, auto-revelação, lado defensivo.
- Não gosta: De rejeição e de fatos ‘puros’ ou falta de emoção. Parece Afetuoso, Integrador, flexível.
- Consegue: Empatia, usar diferentes estilos com diferentes pessoas ou grupos; anedotas pessoais.
- Eficaz: Quando é necessário envolvimento e compromisso duradouro; quando as soluções dependem de uma estreita colaboração.
- Ineficaz: Quando são necessárias soluções rápidas; quando os outros não têm iniciativa e experiência.
- Pontos fortes: Estabelece a confiança; relações duradouras, compromisso.
- Pontos fracos: Pode parecer que não tem opinião ou posição.
4. EXPRESSIVO
Tenta influir Criando e ouvindo visões e sonhos comuns.
- Valores/Gostos Intercâmbio: Aberto de ideias, sonhos, objetivos, ‘grande cenário’.
- Não gosta: De discussão racional, fria ou análise de dados. Evitar parecer igual aos outros;
- Parece: Atencioso, perceptivo, compreende os outros.
- Expressa: Cenários futuros, emoções, metáforas.
- Consegue usar: Questionamento indireto, maneiras de obter o consenso.
- Eficaz: Quando Valores e interesses devem ser unidos para objetivo ou projeto maior.
- Ineficaz: Quando não há confiança e são necessárias soluções rápidas.
- Pontos fortes: Nutre soluções criativas novas; ‘mirabolantes’; posterga dificuldades imediatas e passageiras.
- Pontos fracos: Podem ser perturbados por emoções ou sonhos; atrasam as decisões.
Como negociar em M&A com cada estilo?
Durante uma negociação em M&A você deverá prestar atenção nos estilos comportamentais que comentamos acima, para que dessa forma, você possa conseguir vantagens competitivas com os 4 perfis.
Negociando com o ANALÍTICO
Devido aos ANALÍTICOS serem muito orientados para os fatos, eles gostam de algumas estatísticas para apoiar suas hipóteses ou pedidos. Certamente apreciariam uma discussão racional de quaisquer problemas envolvidos e se preocupam muito com o conteúdo. ‘Qual é o assunto?” é o tipo de pergunta feita pelos ANALÍTICOS, especialmente se eles sentem que estão sendo ‘enrolados’.
Os ANALÍTICOS querem fatos, mas os querem de uma maneira lógica, estruturada. No início de uma apresentação, os ANALÍTICOS querem saber quais são os procedimentos e as regras básicas. Eles não gostam de surpresas.
Do que um ANALÍTICO não gostaria se estivéssemos apresentando alguma coisa ou estivéssemos a influenciá-lo?
Você pode omitir as suposições vagas ou indistintas, pois o ANALÍTICO só quer fatos incisivos e prováveis. E, ainda mais, uma discussão demorada sobre os seus ideais pessoais, emoções e crenças provavelmente encontraria ouvidos surdos se você estivesse tentando influenciar um ANALÍTICO. Quando são abordados dessa maneira, eles até se sentem incomodados porque acham que no ambiente de negócios não há lugar para conversas emocionais. Os ANALÍTICOS também se sentem mal em situações ambíguas ou não estruturadas. Se você vai ter uma reunião com um ANALÍTICO, certifique-se de tê-la planejado cuidadosamente, com antecedência por meio de uma agenda e de objetos claramente definidos.
Negociando com o PRAGMÁTICO
Se você estiver fazendo uma apresentação à uma pessoa que prefere o estilo PRAGMÁTICO, quais são as coisas de que essa pessoa poderia gostar?
Os PRAGMÁTICOS querem saber quais as recompensas oferecidas se eles concordarem com o que você está propondo. Também querem saber quais as consequências negativas.
Ele aceita muito bem uma boa negociação e uma barganha como parte do processo de influência. Ele provavelmente gostaria de ouvir alguma coisa sobre exemplos de casos de negociações anteriores que possam ser semelhantes à situação atual, e sobre como se originaram.
O PRAGMÁTICO é muito orientado no sentido dos resultados. Uma descrição clara dos objetivos, padrões, medidas e planos de longo alcance contribuirá para que o PRAGMÁTICO se sinta bem com você.
Quando o PRAGMÁTICO não é influenciado? De que o PRAGMÁTICO não gosta?
Os pragmáticos são muito motivados por recompensas e, portanto, se perceberem que não haverá recompensa alguma ou se estas não estiverem claramente definidas, eles não se interessarão pelo que você está propondo ou oferecendo.
Como encaram a negociação como um jogo e a barganha como um esporte, se alguma coisa lhes é apresentada de modo absoluto, eles não vêem como algo interessante ou intrigante.
Eles são práticos e pragmáticos, por isso deixam passar longe das discussões longas e teóricas. Para os PRAGMÁTICOS, esse nível de conversação não parece conduzir a coisa alguma.
Eles também não gostam de conversas emocionais. Assim como os ANALÍTICOS, eles acham que esse tipo de conversa não tem lugar nos negócios e que os assuntos de base são os únicos assuntos que compensa discutir.
Negociando com o INTEGRADOR
É claro, como os INTEGRADORES valorizam as relações, eles geralmente acolhem bem uma história humana interessante que você tenha para apresentar, especialmente se essa história for relevante aos negócios em discussão.
Com os INTEGRADORES, os resultados são conseguidos acrescentando-se uma dimensão humana à relação de trabalho. Eles apreciam o toque pessoal – uma pequena conversa sobre sua vida particular, permitindo que eles o encarem como uma pessoa.
Um INTEGRADOR gosta do intercâmbio de idéias e mesmo de conversas superficiais, porque estas promovem as relações que os INTEGRADORES consideram básicas para as transações nos negócios.
Os INTEGRADORES gostam de ouvir, portanto você pode até desviar-se um pouco da sua agenda de reuniões. Lembre-se de que eles também gostam de bons ouvintes; portanto, abra os seus ouvidos e deixe-os ‘entrar no ar’ por um tempo razoável. Você será recompensado, muito provavelmente, com uma situação ganhar-ganhar, na qual obterá os resultados que você quer.
Quando o INTEGRADOR não é Influenciado?
Se você está planejando apresentar alguma coisa a um INTEGRADOR, a abordagem que traz apenas os fatos, mas vem desacompanhada de dados, não será suficiente. Será muito fraca e sem substância. Além disso, você não deve se esquecer de que os INTEGRADORES usualmente não gostam de trabalhar isolados porque são muito gregários e com tendência ao relacionamento. Geralmente é uma boa ideia planejar o trabalho em grupo, equipe ou força-tarefa.
Negociando com o EXPRESSIVO
Utilizando-se de metáforas e imagens, com ênfase no futuro, criando uma missão compartilhada ou visão comum. As pessoas que usam este estilo eficientemente mobilizam a energia e os recursos de outros por meio de apelos as suas esperanças, valores e mais altas aspirações e sonhos. Eles tocam na mesma tecla e nos inspiram a apoiá-los na consecução dos objetivos. Eles sabem como nos convencer de que seus objetivos são nossos objetivos.
Quando o EXPRESSIVO não é influenciado?
O estilo EXPRESSIVO será ineficaz quando ainda não tiver sido estabelecida a confiança ou quando ainda não se houver atingido a harmonia. Além disso, esse estilo não funciona bem quando é necessária uma solução rápida. O EXPRESSIVO precisa de tempo. Ele precisa desenvolver relações, ganhar confiança e lentamente unir os valores e recursos para uma missão compartilhada.
Dica Extra para negociações em M&A
Agora que você conhece os 4 estilos comportamentais em uma negociação, lembre-se que temos 2 tipos preponderantes de investidores: Os Estratégicos e os Financeiros.
Os Estratégicos são empresas que podem atuar no mesmo segmento que a sua empresa e podem se interessar mais por aspectos como cultura, time e visão de futuro, principalmente se for considerada uma fusão ou maior permanência dos atuais acionistas. Se forem controlados pelos fundadores, podem ter um perfil, inicialmente, mais integrador e expressivo, caso busquem uma visão de longo prazo. Ou seja, antes do pragmatismo dos números e de uma abordagem mais analítica, podem conduzir a negociação dentro de uma abordagem mais emocional, com foco na criação de vínculos, antes de evoluir para etapas mais aprofundadas.
Já os investidores financeiros, em geral, não conseguem disfarçar, mesmo quando tentam uma abordagem mais voltada para o engajamento, dura poucos minutos até que as perguntas pragmáticas tomem conta da mesa de negociação. Aqui o empresário precisa entender que negocia com um time, cujos batimentos cardíacos se quer altera, mesmo nas ofertas mais indecorosas.
Conclusão
O processo de negociação em M&A é na essência um leilão privado, implícito, que será tão eficaz quanto a percepção dos potenciais compradores do “apetite” de seus concorrentes no leilão. Ter alternativas é tão importante para o vendedor quanto para o comprador.
Particularmente, recomendo que o vendedor tenha a companhia de um negociador profissional com perfil complementar, justamente para fazer um contraponto ao seu julgamento.
EXTRA
Agradeço e recomendo a leitura de livros e artigos dos seguintes autores que foram utilizados como base para produção deste artigo:
- Eduardo Luzio, Fusões e Aquisições em Ato, 2015
- Profª Azizeh Emleh, Estilos Comportamentais em Negociação, 2016
- Roger Fisher, William Ury e Bruce Patton, Como chegar ao sim, 2018